Totalmente imerso na gestão do programa de ajustamento, o Governo não tem qualquer agenda para a frente política e em particular para combater este crescente distanciamento entre os cidadãos e o sistema político. No entanto, essa agenda política deveria existir. Diria até que deveria ser prioritária. O Governo tem de ter uma estratégia que procure conferir ao cidadão o poder político que ele sente não ter. E isso passa por criar círculos uninominais e permitir a candidatura de cidadãos independentes ao Parlamento, e em paralelo valorizar o papel dos deputados, reduzindo o seu número e proibindo, salvo circunstâncias excepcionais, a sua substituição a meio de uma legislatura, ou a sua permanência no cargo sem ser em exclusivo.
Bem sei que a troika não se preocupa com isto. Mas o Governo deveria preocupar-se, por razões várias. Se Pedro Passos Coelho tiver a coragem e a sensibilidade política para atacar de frente esta questão, estou certo que não lhe faltará apoio político junto dos cidadãos. Se assim entender, o Primeiro-Ministro que proponha eventualmente um referendo. É preciso reaproximar o sistema político e os cidadãos, com o intuito de conferir legitimidade renovada à nossa vida colectiva. Se Passos Coelho não fizer, é muito possível que outros o façam por si. É regra lembrar que a política tem horror ao vácuo. Tenha ou não, a alternativa passa por continuar neste caminho sem retorno de apodrecimento do sistema político e partidário, algo que manifestamente não me parece ser uma solução aceitável.