Paulo Portas pediu que Portugal seja proactivo, "sem ser beligerante", "quer política, quer tecnicamente", nas negociações com a troika na próxima avaliação, a sexta, que terá lugar em Novembro.
Esta intervenção de Paulo Portas é muito interessante. Tal significa que o ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) reconhece que até aqui Portugal não o tem sido. Este reconhecimento é uma novidade, uma vez que pela primeira vez um membro do Governo admite descolar, ainda que parcialmente, da estratégia do bom aluno. Adicionalmente, interpreto estas palavras como uma admissão de culpa (na parte política) e uma crítica a Vítor Gaspar (na componente técnica). Mais importante e aquilo que é essencial: Portas sinaliza uma eventual alteração de curso táctico.
"Nós também lemos, também ouvimos, também sabemos as evoluções no pensamento internacional sobre os programas de ajustamento. E por isso reafirmo aqui que considero importantes e amigas as declarações da senhora directora-geral do Fundo Monetário Internacional", afirmou o MNE, referindo-se às declarações de Christine Lagarde. Ora, admitindo que possa estar a preparar-se um ajustamento de táctica, ou mesmo até de estratégia, importa definir muito claramente os objectivos.
Aparentemente, o Governo continua a não querer mais tempo, aliás em sentido contrário ao que foi sugerido por Lagarde. O alvo serão as taxas de juro?
Não sei.
Independentemente de se avançar na renegociação das taxas de juro, serão seleccionados outros temas?
Julgo que sim. Parece-me que Governo se está a preparar para fazer frente à troika noutras matérias. O valor do IRC de 10%, por exemplo, e que o FMI alega desconhecer, por agora. O valor do IRC, recorde-se, foi um dos pontos de enorme divergência entre a Irlanda e a União Europeia e no próprio seio da União Europeia.
Não haja dúvidas. A margem de manobra de Portugal está seguramente a aumentar. Numa leitura rápida, encontro três motivos para isso. Primeiro, Portugal tudo tem feito de acordo com as recomendações da troika. A estratégia do bom aluno confere algum espaço de manobra a Portugal, espaço esse que não tinha anteriormente. (By the way, é curioso comparar o apelo à proactividade de Portas com a inexistência de espaço de manobra negocial de Gaspar, o homem da maratona...) Segundo, intervenções como a de Christine Lagarde, bem como as posições assumidas recentemente pelo FMI, abriram uma brecha na ortodoxia oficial e poderão permitir a abertura de algum espaço para a política e a negociação. Terceiro, a capacidade negocial da troika diminui à medida que sucessivas tranches do empréstimo vão sendo transferidas. Dito de outro maneira, à medida que a cenoura diminui, de igual modo diminui também o bastão. Tudo somado, Portugal tem espaço para, hipoteticamente, assumir uma nova postura. Veremos, a seu tempo, quais os resultados alcançados pela proactividade.
Quer isto dizer que o Governo finalmente começa a ajustar a narrativa oficial à realidade?
A confirmar-se são excelentes notícias, como é óbvio.