Mário Soares, naturalmente, não é homem de enviar um email. O ex-Presidente, claro está, envia a tradicional carta, subscrita pelos personagens do costume. A carta é essencialmente um exercício para consumo interno no PS e para Soares fazer prova de vida política. Acontece que noutros tempos, em vez de 70, esta carta teria sido assinada por 700 personalidades. (Esta coisa das personalidades, refira-se, tem muito que se lhe diga. Fica para uma outra oportunidade.) Soares poderia exigir o realinhamento físico dos planetas no sistema solar por ordem alfabética, ou a redefinição do calendário gregoriano, e ninguém pensaria duas vezes antes de assinar. O que mudou?
Noutros tempos, o faro político de Soares não o deixava ficar mal desta maneira. A sua intuição dir-lhe-ia imediatamente que esta carta é um exercício infeliz, um sinal de fraqueza e não de força. E dir-lhe-ia também que em democracia o voto dos portugueses é soberano, por muito que isso custe a Soares. O actual Governo, goste-se ou não dele, foi eleito para cumprir um mandato e é esse mandato que está a cumprir. Lamento se tal prejudica as conveniências de Soares e de alguns amigos.